Embrapa Guaratiba cria Rede de Ranicultura e mercado pode sonhar
Visando aproveitar as oportunidades de mercado e incentivar a produção, a Embrapa Agroindústria de Alimentos (RJ) situada em Guaratiba, através de pesquisas desenvolveu vários produtos a partir do dorso da Rã, normalmente descartado pelos consumidores que preferem as coxas do animal.
Para integrar a pesquisa e a extensão rural e divulgar informações da área de criação de rã, a empresa criou a “Ranicultura em Rede”. Mais de 300 consumidores, fornecedores, produtores, comerciantes, pesquisadores e técnicos de extensão rural interessados na criação de rãs participam ativamente das atividades do grupo.
A rede realiza capacitação técnica para multiplicadores, extensionistas e membros da assistência técnica estadual. Também promove o compartilhamento de experiências e boas práticas de manejo e produção, realiza eventos como o Dia de Campo mantém uma lista de e-mails e deve lançar em breve um hotsite para interação entre os membros
“O mais recente produto dessa articulação é a publicação “Manual Técnico de Ranicultura” que visa capacitar técnicos extensionistas e apontar soluções para os problemas tecnológicos na cadeia ranícola brasileira. A publicação tem custo de 10 reais mais frete e pode ser solicitada pelo e-mail: [email protected]. A presença da Embrapa fortalece as instituições e os atores que participam dessa cadeia produtiva, disseminando novos conhecimentos e tecnologias para o setor produtivo e buscando soluções tecnológicas para os problemas existentes”, afirma André Cribb, pesquisador da Embrapa e líder da Rede.
A exploração da Ranicultura pode ser usada hoje como ferramenta contra a recessão sob a ótica da inovação, criatividade e oportunidade. Os resultados do trabalho foram amplamente debatidos e divulgados pela rede e o estudo completo do tema pode ser aproveitado como alternativa a quem não vê saída para a produção nacional diante da crise generalizada que assola o país:
O sabor suave – entre a carne de frango e peixe – e os benefícios nutricionais da carne de rã têm atraído consumidores que buscam uma alimentação mais saudável. Para aproveitar o dorso da rã, matéria-prima até então descartada, a Embrapa Agroindústria de Alimentos (RJ) pesquisou e desenvolveu produtos como patês, salsichas e conservas de carne de rã. A demanda por carne de rã é maior que a oferta no Brasil.
O aproveitamento da carne do dorso da rã para a fabricação de produtos agroindustriais foi testado pela pesquisadora Angela Furtado, buscando alternativas aos ranicultores para agregação de valor a um subproduto do abate, de baixo valor comercial.
O teste de aceitabilidade da conserva de carne desfiada de dorso de rã indicou que 94% dos consumidores gostaram do produto e que 64% dos consumidores que provaram a carne de rã comprariam o produto. Ou seja, o produto processado agrada mais o paladar do público. Nessa mesma linha, a pesquisadora da Embrapa também realizou estudos para o desenvolvimento de salsicha e patê de carne de dorso da rã, que possuem menor valor calórico, menor teor de gordura e maiores concentrações de fósforo e cálcio que salsichas e patês de carne bovina e suína. “A fabricação de conservas, salsichas e patês com carne mecanicamente separada de dorso de carne de rã é tecnicamente viável e ainda não existe no mercado produtos similares”, conta Angela Furtado.
O consumo da carne de rã é um hábito praticado na China há mais de quatro mil anos. Era reconhecida pelos gregos – responsáveis pela difusão deste costume pela Europa – pelas suas propriedades em prol da saúde. Na França, ainda hoje existe uma receita tradicional denominada rã provençal, feita com as pernas da rã e ervas de Pro vence. Os países asiáticos também apreciam muito a carne do anfíbio. No Brasil, já é possível encontrar pratos com carne de rã em restaurantes internacionais ou como aperitivo em bares e botecos da região Sudeste, especialmente São Paulo e Rio de Janeiro.
O público consumidor da carne de rã é formado principalmente por apreciadores da cozinha francesa, pessoas que viajam e clientes em dieta médica. Com alto índice de aminoácidos e proteínas, baixo teor de gorduras e sódio, grande quantidade de vitaminas e minerais como cálcio, ferro e potássio; essa carne de fácil digestão é altamente recomendada para crianças e idosos, além de pessoas com problemas de desnutrição, colesterol alto e alergias alimentares. É ideal também para quem está em dieta para emagrecimento. “Aos poucos, o preconceito em relação ao consumo de rã vem diminuindo e o consumo aumentando, devido aos benefícios de sua ingestão para a saúde humana. Cada 100 gramas da carne possuem em torno de 69 calorias e 0,45% de gordura. A proteína contida na carne é de alto valor biológico, superando o padrão da Organização Mundial da Saúde para crianças e adultos. Por isso, é cada vez mais procurada por adeptos da vida saudável, superando a oferta do produto”, afirma André Cribb, pesquisador da Embrapa Agroindústria de Alimentos e líder da Rede de Ranicultura.
As espécies nativas da fauna brasileira como a rã manteiga ou paulistinha e a rã pimenta ou gia só podem ser criadas comercialmente com licença de órgãos ambientais, pois ainda não existe um pacote tecnológico para a criação dessas espécies. A espécie importada rã-touro, contudo, foi a que demonstrou melhor capacidade de se adaptar aos diferentes regimes climáticos do país com bom desempenho produtivo. “São necessários até sete meses para o abate, e a rã dessa espécie pode pesar até um quilo; porém nos ranários comerciais, os maiores animais que são os reprodutores, permanecem em atividade até aproximadamente 700 gramas. O consumo ainda se concentra nas coxas das rãs que correspondem a 60% da carcaça após o abate e o dorso aos 40% restantes”, conta Sílvia Mello, pesquisadora da Fundação Instituto Pesca do Estado do Rio de Janeiro (Fiperj), que desenvolveu um livro sobre processamento e industrialização da carne de rã.
Ranicultura no Brasil
A rã é classificada como pescado, uma denominação que abrange peixes, crustáceos, moluscos, anfíbios, quelônios e mamíferos de água doce ou salgada, usados na alimentação humana. Atualmente, mais de 90% da demanda mundial por carne de rã é atendida por produtos provenientes da caça, principalmente nos países asiáticos, com uma pressão cada vez maior dos grupos ambientalistas pela extinção dessa prática. Por outro lado, o aumento da demanda pela rã e seus produtos tem promovido o desenvolvimento da busca por métodos viáveis de cultivo do animal especialmente no Brasil, onde se procurou desenvolver processos e tecnologias de criação em cativeiro ou em sistema intensivo de produção. Considerando o contexto internacional de valorização de produção ambientalmente correta – evitando-se a caça predatória – as ações do Brasil em favor de processos e tecnologias de criação de rã em cativeiro podem ser consideradas fatores de vantagem competitiva no mercado internacional.
Para a criação de rã em cativeiro é necessário um rígido controle das condições ambientais, medições diárias de temperatura do ar (máxima e mínima), pH e da amônia da água dos tanques. O Brasil tem se destacado no setor de ranicultura, devido aos resultados das pesquisas desenvolvidas em várias instituições de pesquisa e ensino do país. Atualmente, os últimos dados divulgados pela Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) em 2009 apontam o Brasil como o segundo maior produtor de rã, ficando atrás apenas de Taiwan. Dados do IBGE (2006) revelam que há 170 estabelecimentos de criação de rã, gerando uma produção de cerca de 160 toneladas/ano.
A maioria dos ranicultores brasileiros ainda luta com a baixa produtividade de sua criação, em decorrência da falta de informações técnicas e gerenciais entre os membros da cadeia produtiva, que refletem instalações deficientes e manejos inadequados. “No Rio de Janeiro, de cerca de 200 ranários existentes na década de 80, só restaram 36. Percebemos que falta conhecimento técnico aos produtores”, diz José Seixas, da Fundação Instituto Pesca do Estado do Rio de Janeiro (Fiperj).
Foi por falta de pesquisas e suporte técnico satisfatório para a criação de rã, que, em 1986, Sueli Almeida interessada em criar rãs no Sítio Boa Esperança em Niterói (RJ) adiou o início do projeto. Só em 2000, retomou a ideia e construiu o Ranit- Ranário Niterói. “Possuímos um galpão climatizado que suporta um plantel de 15.000 animais para engorda e na área externa temos a reciclagem da água e os tanques de girinagem. A empresa também oferece curso para formação de novos produtores de rãs. O nosso negócio só cresce”, conta a produtora, satisfeita.
A questão da água
Os anfíbios como as rãs possuem duas fases distintas em suas vidas: uma exclusivamente aquática como girinos e outra aquática e terrestre. Na fase aquática, respiram como peixes através de brânquia. A fase de girino pode durar desde 70 dias até vários meses, dependendo principalmente da temperatura da água dos tanques. Um dos fatores principais para o sucesso da atividade de ranicultura é a qualidade de água, isto porque as rãs deixam suas excretas e restos de pele nos tanques de produção. Para que não sejam acumuladas substâncias tóxicas ao organismo dos animais, é necessário que a água seja renovada constantemente.
A Unidade de Pesquisa em Ranicultura da Estação Experimental de Aquicultura Almirante Paulo Moreira, da Fundação Instituto de Pesca do Estado do Rio de Janeiro (FIPERJ), em parceria com o Centro Universitário Augusto Motta (UNISUAM) e a Embrapa Agroindústria de Alimentos contribuiu para a cadeia produtiva da ranicultura com uma inovação tecnológica que é reaproveitamento da água no setor de girinagem da criação, que consiste em um sistema de filtragem biológica, que proporciona autonomia, ampliando as áreas de criação da rã-touro, mesmo em lugares com pouca disponibilidade, viabilizando a produção de girinos. Trata-se de um sistema baseado na filtragem de aquário já utilizado para a criação de camarão em cativeiro. No sistema de reuso de água, os tanques devem sofrer uma recirculação de 200% do seu volume a cada 24 horas.
Nessa filtragem biológica, as colônias de bactérias nitrificantes, como Nitrobacter e Nitrosomonas, convertem formas inorgânicas reduzidas do nitrogênio a formas oxidadas, reduzindo os níveis de amônia tóxica, possibilitando o reuso da água por um tempo indeterminado. A água também pode ser descartada no meio ambiente e os resíduos sólidos utilizados como adubo. Essas técnicas estão relatadas em duas publicações distribuídas gratuitamente nas oficinas de difusão de conhecimento realizadas pela Rede de Ranicultura: “Manual Prático para Criação de rãs com reuso de água: Girinagem e Metamorfose” e “Implantação de sistema de filtragem biológica para reuso de água na Produção de Girinos de rã-touro (Lithobates catesbeianus)”.
A implantação de galpão de girinagem em sistema de reuso de água é de aproximadamente 50 mil reais e pode ser conhecido nas instalações da Fiperj, no Rio de Janeiro. “Esse sistema gera imagos grandes e saudáveis, reduz o tempo de engorda e em cerca de 30% do tempo de girinagem sem stress, sem amônia, de forma confortável para o animal; o que resulta em ganho de produtividade”, conta o pesquisador José Seixas, da Fundação Instituto Pesca do Estado do Rio de Janeiro (Fiperj) e professor da UNISUAM.
Novas pesquisas na área ranícola
As pesquisas desenvolvidas pelo convênio FIPERJ/UNISUAM, com o apoio da rede de Ranicultura também preveem a elaboração de uma ração própria para girinos que melhora o desempenho dos animais, balanceada a base de farinhas de frutas. Essa tecnologia desenvolvida pelo pesquisador José Seixas e sua equipe, que, apesar de estar em fase experimental, já apresenta bons resultados. Hoje em dia ainda se utiliza ração para peixes, pouco adequada ao modo de vida aquática e terrestre das rãs.
Mais informações sobre o tema
Serviço de Atendimento ao Cidadão (SAC)
www.embrapa.br/fale-conosco/sac/